Hoje é dia de São Pedro, aquele
que guarda as chaves do Céu e porque é “pedra”, edifica-se à sua volta a Igreja,
isto é, o corpo místico de Cristo que somos todos nós. Lendo as suas duas
cartas colocadas no Novo Testamento, encontramos um homem simples, popular, que
não se deixa intimidar pelo meio intelectual e filosófico do mundo grego onde
se movimenta e que fala sobretudo através de frases feitas do senso comum e dos
ditados populares tão ao gosto de um Jerónimo de Sousa, outro papa de outras
“igrejas”: “O cão voltou ao seu próprio
vómito e a porca acabada de se lavar voltou a revolver-se na lama.” 2º Pd 2,22.
É assim para quem ocupa a cadeira
de Pedro. O actual papa gosta de usar sentenças simples, carregadas de bom
senso que voam directas e certeiras ao coração dos homens e das mulheres: “Não existe mãe solteira, existe mãe…”.
De gostos simples (que não se
podem confundir com humildade), e extrovertido, lida bem com as situações
que saem da norma reagindo rapidamente. Característica que lhe permite pegar
numa criança e colocá-la no papamobile,
causando sobressaltos à segurança e fazendo as delícias dos meios de
comunicação, que aproveitam a circunstância de o papa ter problemas ortopédicos
que o obrigam a recusar os tradicionais sapatos vermelhos simbolizando o sangue
dos mártires, para o compararem com a aparente sofisticação do anterior papa.
O povo cai na armadilha dos meios
de comunicação. Os mesmos meios que denegriram a imagem do anterior papa correm
agora a criar a imagem de um papa amigo e simples, imagem que o Vaticano se
apressa a corroborar.
A humildade de Bento XVI que o
impedia de recusar o tradicional para impor a sua vontade (os humildes não
impõem vontades, mesmo as mais simples), a sua sofisticação que se manifestava
no gosto pelo belo artístico, pela filosofia e pelo confronto intelectual,
criaram a imagem de um ultramontano. Introvertido por natureza, lidava mal com
as situações inesperadas e com os media. O ultramontanismo de que lhe acusam
não deixa de ser irónico num papa cujas características o aproximavam da
simplicidade de um protestantismo germânico.
Se o papa Francisco diz
rapidamente coisas bonitas, simples e populares, Bento XVI, logo no início do
seu pontificado, escreveu o mesmo e muito mais na sua maravilhosa e luminosa
encíclica: “Deus é Amor” onde, sem timidez, fala do amor sexual, da amizade e
da caridade que só o é quando olha o outro como a verdadeira imagem de um Deus
que não se pode conhecer.
Fora a sofisticação intelectual e
a submissão à tradição, nada de mais substantivo separa os dois papas.
Esta minha divisão entre dois
papas vivos, é São Pedro quem vai resolver quando, reconhecendo as suas
limitações intelectuais, fala de Paulo, outro santo de quem se comemora o dia e que escreve à maneira da escola filosófica
grega:
“Reparem na paciência de nosso Senhor. Ela é para nossa salvação, tal
como disse o nosso caríssimo irmão Paulo ao escrever-lhes, conforme a sabedoria
que Deus lhe deu.
Escreveu isso em todas as cartas quando trata deste assunto. Nessas
cartas, há passagens difíceis de entender que os ignorantes e pouco firmes na
fé explicam erradamente, como fazem com outras passagens da Escritura, para sua
própria perdição.” 2º Pd 3, 15-16
Pronto, está um lindo dia e é
tempo para ir à rua festejar com alegria o ciclo dos santos populares.
Imagem: São Pedro de
Grão Vasco, tirada daqui: